[NÃO SE TECE A VIDA]
Não se tece a vida
em teares mecânicos.
Nada inda foi dito.
Expatriado, choras
teu perdido anelo
de estar frente aos altares
de onde recende a luz
do alto, te transporta.
Quando levitas, ousas
sorrir e assim prossegues
— cintilas nesta noite
de sombra cerrada.
O divino transporta
teu viver encantado.
Maria da Conceição Paranhos
domingo, 6 de dezembro de 2009
sábado, 28 de novembro de 2009
Poesia de Nicolas Behr
neste país sem memória
vou construir um memorial
em memória de todos
vou construir um memorial
em memória de todos
os construtores de cidades
Memorial JKLMNOPQRSTUVXZ
Memorial JKLMNOPQRSTUVXZ
Nicolas Behr
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
Poesia de Renato Suttana
UM OLHO
I
Um olho
baço,
cego,
e nenhum
pensamento
na noite opaca.
E estar girando
como uma
folha
seca
no vento:
o vento
não é nenhum
pensamento.
Não é
senão
o que sopra
lá fora.
(Seu assobio
nos beirais.)
Um olho
neutro, nulo –
porém cego,
na noite
fria.
II
Vasto
é o círculo
que a noite traça
ao redor
do olho:
e negro
e lento
e impenetrável
por dentro
como um caroço
na treva –
como uma
pedra.
E espesso
mais que o
pensamento
que tenta
atravessá-lo
na
escuridão.
Renato Suttana
I
Um olho
baço,
cego,
e nenhum
pensamento
na noite opaca.
E estar girando
como uma
folha
seca
no vento:
o vento
não é nenhum
pensamento.
Não é
senão
o que sopra
lá fora.
(Seu assobio
nos beirais.)
Um olho
neutro, nulo –
porém cego,
na noite
fria.
II
Vasto
é o círculo
que a noite traça
ao redor
do olho:
e negro
e lento
e impenetrável
por dentro
como um caroço
na treva –
como uma
pedra.
E espesso
mais que o
pensamento
que tenta
atravessá-lo
na
escuridão.
Renato Suttana
segunda-feira, 12 de outubro de 2009
Poesia de Artur Gomes
Bolero Blue
beber desse conhac em tua boca
para matar a febre nas entranhas
entre/dentes
indecente é a forma que te como
bebo ou calo
e se não falo quando quero
na balada ou no bolero
não é por falta de desejo
é que a fome desse beijo
furta qualquer outra palavra presa
como caça indefesa
dentro da carne que não sai
Artur Gomes
beber desse conhac em tua boca
para matar a febre nas entranhas
entre/dentes
indecente é a forma que te como
bebo ou calo
e se não falo quando quero
na balada ou no bolero
não é por falta de desejo
é que a fome desse beijo
furta qualquer outra palavra presa
como caça indefesa
dentro da carne que não sai
Artur Gomes
terça-feira, 29 de setembro de 2009
Poesia de Ademir Assunção
O COISA RUIM
me querem manso
cordeiro
imaculado
sangrado
no festim dos canibais
me querem escravo
ordeiro
serviçal
salário apertado no bolso
cego mudo e boçal
me querem rato
acuado
rabo entre as pernas
medroso
um verme, pegajoso
mas eu sou osso
duro de roer
caroço
faca no pescoço
maremoto, tufão, furacão
mas eu sou cão
lato
mordo
arreganho os dentes
incito a revolta dos deuses
toco fogo na cidade
qual nero
devasto o lero lero
entro em campo
desempato
eu sou o que sangra
um poeta nato
Ademir Assunção
sexta-feira, 21 de agosto de 2009
Poesia de Marília Kubota
EXAUSTO
Saudades de Adélia Prado.
Eu quero uma licença de dormir,
perdão pra descansar horas a fio,
sem ao menos sonhar
a leve palha de um pequeno sonho.
Quero o que antes da vida
foi o sono profundo das espécies,
a graça de um estado.
Semente.
Muito mais que raízes.
Marilia Kubota
sexta-feira, 24 de julho de 2009
Poesia de Rodrigo de Souza Leão
Um poema ou um poente
Tudo tem um forte sentido
Quando não se oprime o indivíduo
Alguém soletra uma distância
A distância separa os fatos
A verdade não é tão necessária
Já que Heráclito já morreu
Rodrigo de Souza Leão
quinta-feira, 16 de julho de 2009
Poesia de Claudio Daniel
Sêneca Dor é algo atroz (fungos violeta). Água sonora, vai de uma a outra concha, ama- relece (folha de trevo) e cai. Diz então, em que ilha- olho-de-chama —Ítaca, talvez — vesti-me de pele desolada, e padeci, fera entre feras? Por que, brutal, me arrasto nesta terra? Para a glória do Sublime? Por meus débitos, hora de decepar vogais? Cala Sibila, calam Córdova e Roma, sou todo farelo, e se fecha a porta do canto. Que direi a mim, após celebrar o rito da memória? — Bebe o teu vinho e aceita o universo, eis o caminho da iniciação. 1999
Claudio Daniel
terça-feira, 23 de junho de 2009
Poesia de Antonio Carlos Barreto
AGALOPADO
Sou mais que as manadas ao som do chocalho,
esteira de prata nas larvas de fogo,
transtorno de outono buscando agasalho:
espadas, mugidos, relógios, agouros.
O fogo dos ventos soprando do norte,
a noite azulada tangendo os abismos.
Na dança da flecha se vão os aforismos:
paisagens, caminhos, sertões, um galope.
Lonjuras, espinhos, mais um retirante;
que pasme a cidade ante o vôo do condor
e a orquestra afinada dos ventos uivantes
no entulho da morte dos sonhos de amor.
Não morro no inferno traçado por Dante
porque codifico a loucura que sou.
Antonio Carlos Barreto
esteira de prata nas larvas de fogo,
transtorno de outono buscando agasalho:
espadas, mugidos, relógios, agouros.
O fogo dos ventos soprando do norte,
a noite azulada tangendo os abismos.
Na dança da flecha se vão os aforismos:
paisagens, caminhos, sertões, um galope.
que pasme a cidade ante o vôo do condor
e a orquestra afinada dos ventos uivantes
Não morro no inferno traçado por Dante
porque codifico a loucura que sou.
quarta-feira, 13 de maio de 2009
Poesia de Miguel Carneiro para Kzé
PARA EMBALAR KZÉ EM SEU DELÍRIO NOTURNO
Em memória de José Narciso de Magalhães Carvalho Moraes Filho, ZECA DE MAGALHÃES (1959-2007)
“Aliás não temos aqui cidade permanente, vamos em busca da futura.” Hebreus, 13-15.
em Pindorama,
quando a folia momesca,
reinava na velha província da Baía de Todos os Santos e Inevitáveis Demônios.
Entre a cana,
o colosso dos camarotes da Barra
e a falsa alegria,
e o Tempo com sua traíragem,
que resolveu te tirar de campo,
te descendo do telhado.
Deixou os teus,
órfãos de tua amizade
e de tua poesia.
Não era ainda
nem segundo tempo,
e nem havíamos ganhado o jogo.
Mas,
em memória de ti,
poeta leminskiano,
abominador da mediocridade poética baiana de igrejinhas e confrarias cafonas.
Não recolheremos nossas bandeiras,
nem meteremos nossos rabos entre as pernas,
nem ficaremos desiludidos,
nem abaixaremos nossas frontes
para os chacais da palavra.
Ficamos,sim,
aqui,
todos os teus,
que te foram ternos,
passando uma chuva
com teu verso clandestino na memória
e aquela certeza absoluta
que a tua luta
não foi em vão.
Ficaram poucos...
Mas teu nome, Narciso,
será sempre eterno em meu coração.
25/02/2007
Miguel Carneiro
quarta-feira, 15 de abril de 2009
Poesia de Wladimir Saldanha
MARINHA COM CACHORROS
Vi-os latirem para o mar,
treparem nas pedras que se empilham
no sopé do Mont Serrat
enquanto branquejavam murada
e bastiões do velho forte, feito museu.
Vi-os, cachorros, compondo seu balé de ferozes,
cheirando o quê, de meio à maresia,
era almíscar de fêmea, certeza de prole,
corneta indeclinável,
inodora para mim.
Vi-os maquinando a matilha
de focinhos de virilhas
e, de estéreis rochedos,
urdindo promíscua ilha.
Não os vi chegar. Mais cedo,
que eu, que transitava à toa,
teriam eles, cães, sido impelidos
a desertarem ruas, deveres de guarda,
ossos de aves. E gatos. E desertaram,
e o séquito
rumara colorido para a praia.
Ladravam para as ondas – vi-os. E as ondas
brigavam entre si, elas alheias:
Cães são navios. Eles, úmidos,
mantinham-se ali, caninos porém:
como salgando-se... Até
que desciam; mas subiam novamente
– eu sem entender. Às vezes,
um a outro abocanhava, mas irado,
não apenas por mostrar-se.
Era de tarde: trezentos e tantos da invasão holandesa.
Grato, mui grato,
o portentoso forte,
com seus fantasmas, com seus canhões apontados para o poente,
guarnecia o cio.
Wladimir Saldanha
Vi-os latirem para o mar,
treparem nas pedras que se empilham
no sopé do Mont Serrat
enquanto branquejavam murada
e bastiões do velho forte, feito museu.
Vi-os, cachorros, compondo seu balé de ferozes,
cheirando o quê, de meio à maresia,
era almíscar de fêmea, certeza de prole,
corneta indeclinável,
inodora para mim.
Vi-os maquinando a matilha
de focinhos de virilhas
e, de estéreis rochedos,
urdindo promíscua ilha.
Não os vi chegar. Mais cedo,
que eu, que transitava à toa,
teriam eles, cães, sido impelidos
a desertarem ruas, deveres de guarda,
ossos de aves. E gatos. E desertaram,
e o séquito
rumara colorido para a praia.
Ladravam para as ondas – vi-os. E as ondas
brigavam entre si, elas alheias:
Cães são navios. Eles, úmidos,
mantinham-se ali, caninos porém:
como salgando-se... Até
que desciam; mas subiam novamente
– eu sem entender. Às vezes,
um a outro abocanhava, mas irado,
não apenas por mostrar-se.
Era de tarde: trezentos e tantos da invasão holandesa.
Grato, mui grato,
o portentoso forte,
com seus fantasmas, com seus canhões apontados para o poente,
guarnecia o cio.
Wladimir Saldanha
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