quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

DENTES IGUAIS

Meus olhos desdobram o espaço plano,
As mãos tremem e, nas pernas as dores,
Para o fim que desdiz escândalo engano:

O futuro vai à frente dos meus mentores.

De um lado, as cercas e as flores da casa,
Do outro, poeira da estrada e capim limão,
Duas crianças brincam rindo empolgadas:
Não se sabe onde foi parar a segregação.

Um ostenta o aparato banhado em ouro,
O outro, um feixe de palitos de madeira.
E decidem trocar entre si seus tesouros:
Ambos de dentes brancos e alvissareiros.

Na curva de 2011


Datas
como marcas no caminho

balizas que se sucedem
independentes & aleatórias.

Passos dados
em direção à grande viagem

ao vôo sem escalas da alma.

O calendário
espelha mais um ano

o menino & o velho
internamente
dialogam alternados...

Prossigo.


Ricardo Mainieri

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Adiamento

Deixo
espessas camadas
do sono
cobrirem-me.

O amanhã
precisa vencer
o inverno e a noite.

Bebo
e celebro a alegria
do momento.

Provisoriamente.

Ricardo Mainieri
__________________________
do livro inédito "O Passaporte de Eros"

sábado, 24 de dezembro de 2011

DORMIR

O sono se exercita, remexe e agita:
Importuna ao que sob a alma habita,
Desconsidera o que tem ao alcance,
O sono dos justos, católicos e amantes.

Em cada agir não sentimos sonolência:
O sonho nos agride tal qual a violência,
Que imprime ao raciocínio a confusão,
Que embota os sentidos e turva a visão.

Ao dormir aquilo que vivo o que sonho,
Sinto minha identidade fugaz e atônita.
E entre o que penso e o que me pareço,
Sobram as trepadeiras no muro espesso.

Quando, então, chega a hora de voltar,
Já não vejo mais corpo, tempo e lugar.
 
 
Eduardo Ribeiro

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Poesia de Maria Carpi

Eu agradeço tudo o que não tive.
Tudo o que não tive não precisa
ser perdido ou apagado. Ninguém
me arrancará dos braços o que não

abracei. a ferrugem estanca a gula
na borda desse nada a perder.
E mais agradeço o que não necessitei
e não tive. O que pedi e implorei,

e não tive. O peso imaterial, pesado
de carregar ou de engavetar, do que
não tive. A constelação longínqua
a um palmo do desejo de não tê-la.

Igual ao olvido de haver nascido
e escrever. O tumulto das luzes
nas altas ervas da cama. O que
a tinta não raptou com a escrita.

Maria Carpi

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Perfumes da memória

Almíscar
impregnando à noite.

Luzes pulsantes
& corpos imantados.

Desejo a dançar pelo salão.

Estagiário da paixão
no clube do bairro

Fantasia consumindo sábados.

E vão rodando céleres
os empoeirados long-plays
nos sulcos da memória.

Na (e)terna nostalgia
de um tempo sem dor.


Ricardo Mainieri

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Poesia de Eduardo Ribeiro

TAUTOLOGIA

Acima e abaixo ou abaixo e acima,
A escrita percorrerá léguas a esmo,
Simulacro do ser frente a si mesmo,
Parricídio que nos devora e fascina.


Quem conceber a imagem do verso,
Será o poeta a instaurar o paradoxo,
Do rabisco dissimulado e heterodoxo,
A academia banida das letras inversas.


Não haverá o afã de buscar o reflexo,
Do retrato geométrico da assimetria,
Não restará dos prêmios um espectro.


Sê visionário e artífice da pobre rima,
Da matéria bruta e minério da poesia,
Diante das palavras e abaixo e acima.

Eduardo Ribeiro

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Álvaro Posselt - receita de Haikais

Já tentei alguns haikais, inutilmente. Minha formação filosófica atrapalha muito este intento. Mas trago uma receita infalível, do poeta e haikaísta talentoso nessa arte.

"podemos sintetizar as características do haikai clássico do Brasil e os cuidados para com sua composição da seguinte forma:


• Poema de origem japonesa composto de três versos.
• Deve possuir o corte (kire) que o divide em duas partes, com o uso da pontuação ou não.
• Evita-se usar mais do que um sinal de pontuação (poluição visual).
• Deve ter um kigo.
• Sua forma (teikei) é composta de 17 sílabas poéticas (5-7-5).
• A natureza é o tema principal.
• É composto no tempo presente e não se usa o gerúndio.

• Usa-se linguagem simples e de fácil compreensão.
• Não intelectualizá-lo.
• O antropomorfismo deve ser descartado.
• Cuidado com o uso de adjetivos.
• Fazê-lo em duas partes, evitar fazer em uma ou três partes.
• Cuidado com o uso de advérbios, locuções adverbiais e interjeições."

alguns bons exemplos podem ser encontrados na página:  o que é o haikai do próprio haicaísta Álvaro Posselt
já a poetisa e haicaísta Sandra Santos "inventou" um haikai infantil: haicai-quebra-cabeça

Drummondiando com Frederico Barbosa

Não resisti e resolvi compartilhar no blog, essa postagem do poeta Frederico Barbosa, que admiro muito, no facebbok. A postagem estava marcada como "público", então penso que não fará mal compartilhar com meus leitores.


"Vamos completar o raciocínio.

1. A FLIP 2012 homenageará Carlos Drummond de Andrade...
2. A Cia. das Letras comprou o direito das obras de Drummond...
3. O Instituto Moreira Salles comprou o acervo de Drummond...
4. O IMS e a Cia. das Letras criaram o Dia D para promover o nome e a obra de Drummond.

5. Pergunta ingênua: quem é dono da Cia. das Letras?

Vejam este trecho de um artigo de Hélio Fernandes:

"O Fernando [Moreira Salles] tem duas obsessões e interesses maiores. A editora (Companhia das Letras, da qual tem 51 por cento) e a mineradora de nióbio de Araxá (...)" (http://paginadoenock.com.br/home/post/1505)

6. Pergunta nada ingênua: quem ganha mais o que com tudo isso?

a) a poesia ganha prestígio
b) Drummond ganha prestígio
c) os poetas do Brasil ganham prestígio
d) a cultura brasileira ganha prestígio
e) banqueiros ganham dinheiro"

Poesia de Álvaro de Santi

MEIO-DIA

Sol a pino
Olhar fixo no prato
Está sentado o homem
Imerso no burburinho
De um restaurante qualquer

Há centenas de coisas
A serem feitas à tarde
E as que não foram de manhã
Tão estranho pedir-lhe
Que saboreie o almoço

Ativo burguês
Corre em torno de si
E corre em busca do quê?
Azeite nas juntas
Energia e decisão

- A conta, por favor

Álvaro de Santis

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Poesia de Wender Montenegro

A DESPEITO DE SARTRE


Se todo homem é uma ilha
onde um náufrago respira;
se o outro é firme sustentáculo
sem o qual cairíamos
- inertes -
com o fardo medonho do ego;

se o inferno do tolo é o ouro,
não o de tolo mas, o outro:
o que reluz de verdadeiro,
áureo desejo do comum dos homens
(autólatras anônimos,
ébrios Narcisos espelhando-se
em vômito);

se nenhum homem é uma trilha
intransitável aos demais,
quem será o inferno do homem?

Wender Montenegro

sábado, 17 de setembro de 2011

Poesia de Paulo de Toledo


se a ubíqua imbecilidade insiste
em levar a sério
tudo isso que não passa de chiste
só resta um remédio
cravar-lhe no cu meu poema em riste


Paulo de Toledo

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011